Ontem escrevi rapidamente sobre o encontro fortuito que tivemos durante a viagem de bicicleta de Amsterdã para Leiden com a adorável professora de gastronomia Suzanne Korevaar. De repente, graças à chuva, paramos no primeiro estabelecimento aberto que avistamos para dar um tempo aguardando que diminuísse o ritmo da pancada e que surpresa boa!
Hoje, um mês exato depois do tal episódio, peguei o cartão que a Suzan me deu e fiz uma pesquisa no site. O Kook Lokaal é o que podemos chamar de estúdio de culinária. Fica entre Kaag & Braasem, duas localidades que formam uma pequena cidade no interior da Holanda. À beira de um canal, na WB Marina, portanto parada propícia para os que têm barcos, numa privilegiada localização em relação a Amsterdã, Leiden e Haia, a escola que também é chamada por eles de taverna é um espaço para aprender a cozinhar, fazer eventos gastronômicos ou festas entre amigos, casamentos, batizados, o que seja. Durante o ano, eles oferecem um vasto calendário de cursos e oportunidades de convivência. Tudo em torno da gastronomia.
Acredito que esse é o sonho de consumo de muita gente que lida com comida no Brasil. Um paraíso sonhado por muitos, mas ainda bem distante. Para criar um empreendimento como esse é preciso ter, no Brasil, um belo sócio investidor. Não basta saber cozinhar bem e ter bom gosto. Não sei como é na Holanda, mas não deve ser muito diferente, embora pareça mais fácil, visto de fora, claro.
O lugar também funciona como restaurante comum e café entre meio-dia e oito da noite. Uma parada facilitada para os barcos atracarem, com estacionamento amplo para carros e uma bela vista das águas do canal e da bucólica vida interiorana holandesa. Para quem pedala ou caminha, o local está entre dois vilarejos muito charmosos, distantes entre si de cinco a oito quilômetros.
Tirando como base a postura cordial e delicada da Suzan parece que todo o staff é bastante feliz trabalhando no kook lokaal.
Durante a conversa com ela soube de sua preferência pelos pratos da cozinha mediterrânea e enquanto visitei a cozinha senti o cheiro agradável de massa assando no forno e pude ver uma aluna manipulando uma massa verde que se tornaria uma torta. Segundo minha anfitriã, na Holanda, os cursos oferecidos de gastronomia têm características semelhantes ao que faço aqui na Unip em São Paulo, são técnicos. Para ela, embora esse tipo de curso seja bem abrangente e dê uma miríade de conhecimentos técnicos aos alunos, não os ensina a ter paladar. Eu concordo com a Susan. Se a compreendi corretamente falta-nos aprender a degustar, experimentar e selecionar o que é bom ao paladar ou não, é o que em inglês se define como “tasting”. Em português, as palavras são gosto, paladar, degustação, sabor, experimentar, e eu diria, experienciar.
Quando viajamos um dos momentos mais críticos que enfrentamos sempre diz respeito à comida. A hora de decidir diante de um cardápio escrito numa lingua que não dominamos o que vamos comer é delicada, isso para dizer o mínimo. É preciso espírito aberto para enfrentar o que pode resultar da escolha feita.
Há restaurantes que cientes dessa condição do cliente estrangeiro têm cardápios também em inglês. O que, caso você também não seja familiarizado com o menu local, não resolve muito. De modo que resta a escolha entre frequentar restaurantes que ofereçam opções internacionais, que lhe garantem que saberá o que vai comer, ou, em busca da novidade, da experimentação, atrever-se a escolher algo que você não conhece perfeitamente, mas que pode lhe trazer um indescritível novo sabor pelo qual poderá se apaixonar completamente. Uma vez iniciado o processo de se abrir para o novo testando novos paladares, dificilmente você vai querer ficar toda a sua viagem só no que já conhece. Se ficar, perde a chance de ser muito, muito, muito feliz. Tá bom, com as novidades pode ter também alguns desencantamentos. Isso faz parte.
Lembrei-me agora de uma torta de limão que comi certa vez num café de um clube em Punta del Este. Que sabor inigualável! Nunca havia comido nada igual em toda a minha vida. Nem tampouco consegui repeti-lo depois de deixar aquele lugar em que estive somente por dois dias. Adoraria ter a receita, mas precisaria de uma certa manobra logística internacional para conseguir. Não tenho sequer o endereço do lugar onde estive, por isso acredito que até poderia conseguir a receita, mas o esforço não seria dos mais fáceis.
Ter encontrado a Suzan, a taverna e a escola de culinária quando esperávamos a chuva passar foi mesmo um momento mágico, uma surpresa fortuita. Comparativamente, foi como a torta de limão no Uruguai, algo novo, desconhecido, mas bem agradável.
Há também os encontros marcados nas viagens. Aqueles pelos quais aguardamos dias e dias até que cheguem. Foi o aconteceu quando chegamos à Alemanha, em Fallersleben, Wolfsburg, na casa da Euzi e lá nos esperavam ela, o Alex e o Rafael. O que estava previamente agendado, cheio de ansiedade, me deu um prazer tão grande, uma sensação tão familiar de encontrar pessoas amadas, cuja história pregressa nos une com o melhor dos afetos, o amor.
Ver o Rafa falando uma lingua toda dele e poder entrar naquela comunicação, vê-lo rindo, correndo, brincando, escapando de nós quando menos esperávamos… Encontro marcado para ser feliz. E fomos!
Sobre essa parte da viagem, terei capítulos específicos.
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Ah! Devido às novas atividades do semestre, possivelmente, a periodicidade do blog deverá mudar. Estou pensando em escrever dia – sim, dia – não.
Serviço:
Kook Lokaal – www.kooklokaal.nl – Plantage 87 – 2377AE Oude Wetering – Tel. 085-877 11 18