Meu amigo Luiz França Reis, homem de bom senso e bom gosto, me desculpe a franqueza, mas não posso concordar com seus argumentos sobre os dias de jogos da Copa.
É preciso fazer a conta, sem dúvida, mas de que vale a vida se não for feita por momentos mágicos e acalorados junto dos amigos e das pessoas que amamos?
Quantas vezes deixamos de estar com a família e os amigos mais queridos para trabalhar, produzir, gerar recursos? E pra quê? Qual é o nosso grande objetivo se não, volto a dizer, curtir emoções com as pessoas que mais queremos bem? Por que o trabalho é tão mais importante que todo o resto?
Eu poderia elencar números de vendas de viagens, empregados renumerados só no envolvimento direto das ações da Copa (sem contar os indiretos), televisores, celulares e serviços de internet, além de camisetas, bandeiras, vuvuzelas, cervejas, amendoins e muitos outros, mas tudo seria pouco frente às obras que ficam paradas em dias de jogos, às indústrias que não produzem em dias de jogos, ao trânsito que não anda em dias de jogos… Que bobagem comparar!
Como lembrou Juca Kfouri, na segunda da semana passada, 9/06, no Roda Viva, é sim dever do Estado promover a felicidade e uma das alegrias é o futebol. O congraçamento entre os cidadãos alcançado por uma Copa do Mundo não tem preço, mesmo que ela seja da Fifa!
“São direitos sociais, essenciais à busca da felicidade, a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.
O trecho acima faz parte da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) protocolada pelo senador Cristovam Buarque em 07 de julho de 2010 para tornar a busca da felicidade um direito previsto na Constituição Brasileira.
Basta um olhar um pouco atento e alguma condescendência consigo mesmo para dar valor e compreender o significado do “lazer” necessário a todas as pessoas, ainda que a “elite branca e racista” acredite que isso é só um direito dela e de mais ninguém! Eu prometi a mim mesma não entrar nessa seara e por aqui interrompo esse tipo de comentário. Foi um deslize, me desculpem.
Eu que não tenho filhos, pergunto quanto custa a um pai ou uma mãe ver sua criança rindo, festejando contente porque está vestindo uma camiseta da seleção verde e amarela na qual se vê estampado o nome de Neymar ou Fred, Marcelo, David Luiz? Por que é assim tão pouco relevante estar com os amigos, ir à festinha do colégio, assistir ao time do Felipão jogar e tão importante atender a qualquer chamado de um chefe dentro de uma empresa ou fora dela? Aposto que o seu telefone celular fica à disposição mesmo que seja tarde… Eu já atendi telefonema de trabalho vindo de uma não sei quem (prefiro não lembrar o nome) no dia da minha lua de mel!!!
Não quero subverter a ordem. Isso nem combina comigo nenhum um pouco. As empresas são muito mais que necessárias somente como provedoras de bens e serviços. Nelas também criamos relações humanas duradouras, verdadeiras, laços que são difíceis de romper quando somos postos para fora devido aos cortes de despesas e em favor do lucro. Nosso coração fica pequeno, a autoestima tem que ser recuperada muitas vezes com muita terapia e isso não tem a ver com produzir, tem a ver com se sentir cidadão pertencente a um grupo. Não é à toa que nos apresentamos como Fulana da Coca-Cola, Beltrano da Natura, Sicrano da Fedex. Isso nos faz pertencer a uma comunidade na qual somos úteis, temos papéis definidos e nos mostramos como pessoas, muito mais do que como profissionais.
A Copa do Mundo nos dá, ao menos aqui no Brasil, estejamos empregados ou não, esse senso de pertencer. Participar da festa é uma escolha, faz quem quiser aproveitar a chance.
Acusem-nos de alienados todos os que estão acima desse ópio. Dele, eu quero a fruta e o caroço. Quero a festa, a alegria e a decepção, se por acaso ocorrer. Mas que seja junto dos que me fazem sentir que sou parte. Enquanto a bola rola a gente consegue, agora pelo Facebook, saber o que estão sentindo os nossos amigos pela rede. Até nisso a gente encontra congraçamento.
Luiz, meu querido, espero que você repense a sua preferência. Eu lhe diria então: que são três dias úteis tornados “inúteis” (se é que entendi bem a sua argumentação), se os boletos vão chegar de qualquer maneira??
Trabalhar é bom e enobrece o homem, mas não é um fim em si. Promover a felicidade é também um dever do Estado em favor do cidadão, mesmo que seja só enquanto tem pipoca na tigela e gritos de olés nos estádios. Que a nossa seleção de atitudes deixe um saldo melhor que zero a zero.
Fotos do Edin Abumanssur que reuniu amigos para ver Brasil e México em sua casa |