Há anos eu sei da existência da Caverna Bugre, apesar de não prestar atenção nesse lugar quando passava em frente, porque não existe nada que chame atenção na fachada.
Morei em Pinheiros mais de 16 anos. Inevitavelmente, meu caminho para subir em direção a Avenida Paulista, quase sempre, era pela rua Teodoro Sampaio, fosse de carro, ônibus ou a pé. Do mesmo jeito a volta caminhando do trabalho pra casa.
Só que há menos de três anos estive lá pela primeira vez. Fomos jantar, Silas e eu, para comemorar alguma coisa. Eu gostei de ter ido naquela ocasião.
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Agora, por conta de um trabalho de avaliação de restaurantes no curso de Gastronomia, sugeri aos meus colegas de grupo que elegêssemos o Bugre para analisar suas qualidades. Embora o grupo seja formado por meia dúzia de pessoas, resolvemos que nossa visita não seria feita em conjunto. Cada um visitaria o espaço num horário e dia da semana. O objetivo era ter impressões sobre o serviço em diversos momentos, para, inclusive, discutirmos a regularidade do atendimento e se há mudanças no tipo de serviço oferecido em horários e dias distintos.
Localização – Já falei que fica na Teodoro Sampaio, a uma quadra e meia da entrada do metrô Clínicas. De dia é uma loucura o fluxo de pessoas na rua e à noite é um lugar que transparece o que foi de dia. Tem sujeira na rua, movimento de carro e barulho de trânsito.
Sistema de reserva – Eu estive no restaurante na sexta-feira, 23/05, para jantar. Fui com o Silas. Chegamos perto das nove da noite, sem ter feito reserva.
Estacionamento/segurança – Não há serviço de manobrista no local, nem lugar para parar o carro na rua até às 20 horas, porque é proibido estacionar na rua Teodoro Sampaio durante o horário comercial. Como chegamos depois desse horário, deixamos o carro a alguns metros do restaurante, na rua mesmo.
Ambiente, decoração e serviço – Minha primeira impressão ao entrar pela segunda vez no local foi de que faz tempo que ali ninguém vê qualquer inovação, treinamento, novidade… Três garçons estavam parados em pé próximos à entrada e, ao nosso movimento de pedir uma mesa já que parte do salão estava ocupado, não se moveram. Vendo que havia lugar, nos sentamos numa mesa embaixo da janela da rua.
Nas paredes, nenhum quadro ou enfeite. Só uma TV de plasma bem grande posicionada num canto superior perto da porta transmitia o fim do Jornal Nacional. O som da TV quase não era ouvido.
Rapidamente, vieram os cardápios de capa de couro com uma cara meio usada, com várias páginas. O Silas estava a fim de tomar uma cerveja diferente e como o restaurante serve comida alemã (apesar de ter sido fundado por um austríaco), pediu referências para o garçom. Ele não sabia informar nada a respeito. Também não se preocupou em pedir auxílio a alguém que soubesse.
O barulho vindo de fora era tão desagradável, com aceleração dos ônibus que sobem pela rua, que mencionamos ao garçom. Ele não nos ofereceu uma troca de mesa, nem tampouco para fechar a janela. Nós é que nos levantamos e, antes que alguém pegasse a mesa do fundo, na parede oposta a que estávamos, fomos nos mudando. Assim, outro garçom passou a nos atender. Ali devia ser outra praça, embora o restaurante seja bem pequeno. O salão tem cerca de 14 mesas apenas.
Enxoval – Louça branca básica, toalhas brancas com cobre-manchas bege. Mise en place também básico. Tudo limpo e asseado.
Bebida/comida – Por conta própria, sem ajuda do garçom, escolhi uma água tônica e meu marido uma cerveja Eisenbahn, pilsen, porque não havia uma pale ale que a preferida dele.
Quanto à comida, escolhemos pratos diferentes. Eu fui no mais tradicional da casa, o filé Alpino, que segundo o site da casa, ganhou o prêmio Prato de Ouro da revista Istoé, em 1995, e o prêmio Paladar, do Estadão, em 2008. O prato do Silas foi uma filé coberto com cebolas. Para ambos foram acompanhava arroz branco e mais nada.
Pedimos como guarnição uma porção de aspargos. Decepcionantes aspargos em conserva passados na manteiga nos foram servidos.
Os pratos vieram em exatos 20 minutos após o pedido. Estavam quentes e saborosos. O filé alpino tem uma grande quantidade de queijo catupiry por cima de uma fatia de copa e um molho inglês onde o filé fica nadando. Os sabores se complementam até a terceira garfada. Depois, é preciso acompanhamento porque se torna um prato bem enjoativo.
A mesma base de molho inglês veio no outro filé, que estava tão suculento e tinha o mesmo também do alpino, só que era coberto por cebolas.
Comemos direitinho, mas eu não premiaria nenhum desses pratos, embora o serviço à mesa tenha sido feito dentro do padrão tradicional, como manda o restaurante. Fomos servidos à inglesa indireto, inclusive na reposição dos itens. Não foi usado gueridon* porque a mesa era para quatro e estávamos em dois, de modo que havia espaço sobrando para manter a comida sobre a mesa, mas não à nossa frente.
Preço – Dado que só comemos o prato e os aspargos, não teve entrada, sobremesa, nem café e bebemos uma única cerveja e um refrigerante, a conta deu R$ 107, com a taxa de serviço, que, vamos combinar, não foi muito bom para o dono do restaurante. O empregado pouco treinado não ofereceu bebida a contento, não sugeriu entrada, couvert ou sobremesa. Atendeu ao que foi pedido, só.
Visite nossa cozinha – Tinha uma plaquinha, mas apesar dela, senti um paredão que constrangeu pedir para dar uma passeada no ambiente. Não dava pra pedir, seria invasivo, dá pra entender?
Fico aqui pensando o que faz um restaurante que tem uma história, a Caverna Bugre foi fundada em 1950, portanto 64 anos, se deixar desse jeito. Talvez os donos estejam cansados, a grana curta e não haja mais uma motivação para reconstruir no dia-a-dia esse passado de sucesso.
Foi uma experiência um pouco frustrante pra mim, porque eu queria que meus colegas tivessem uma boa impressão do lugar que eu sugeri, mas que também, desta vez, não me causou a melhor lembrança.
A dica então é para o dono. Algumas poucas ações pontuais poderiam elevar o padrão novamente (não sei se já foi um restaurante cuidadoso antes) e seria de bom tom dar alguma graça ao lugar. Uma reforminha, uns quadros, alguma decoração fariam bem. A localização é ruim por um lado, mas é muito boa como ponto. Deve ter muito médico das Clínicas que frequenta o lugar. O barulho poderia ser resolvido com pouco esforço e algum investimento, nada absurdo. O cardápio revitalizado seria uma outra solução que tenderia a um bom resultado. Ah! E o site está desatualizado, pode melhorar bastante.
Essa foi uma visita noturna. Talvez no almoço seja diferente, quem sabe melhor ou pior.
Por enquanto, vale a comida, de vez em quando, e nada além.
Boa semana.
Serviço:
Caverna Bugre – Rua Teodoro Sampaio, 334 – tel. 11 3085-6984
*gueridon (fala-se guerridom) – mesa auxiliar sobre a qual o garçom prepara o prato para servir ao cliente