Fazer um curso de gastronomia é uma delícia! Principalmente porque o mundo é vasto e todo mundo come, inclusive, coisas que a gente nem imagina. Só que o grande barato é que aquela comidinha tão familiar pra uns, é muito nova e diferente para outros.
Eu não resisto às novidades, fico super entusiasmada com o que vem e tento aproveitar tudo. Ontem, foi a noite do jacaré!
À parte qualquer preconceito com aquele monstro pré-histórico que está na terra há 250 milhões de anos, convém lembrar que o couro do bicho está nas bolsas mais caras das mais luxuosas grifes, como Louis Vuitton, Burberry e Victor Hugo, e em botas e sapatos que enlouquecem mulheres de todo o planeta.
Bom, já que o alligator mora no guarda-roupa de tanta gente, por que não convidá-los para passar uns dias nas geladeiras e depois ir às mesas de cada vez mais pessoas?
Eu fui convencida de que essa é uma opção muito interessante e possível.
Um grupo formado pelos alunos (Lu Giondo, José Reinaldo, Henrique Camargo, Alberto Antonio e Lucilena Orlando) do 3o. semestre da Gastronomia da Unip, promoveu, ontem, 20/05, uma palestra aberta na sala de A&B (alimentos & bebidas) com o Dr. Glenn Collard, veterinário responsável técnico do criadouro de jacarés de papo-amarelo, do projeto Arurá.
Dr. Glenn Collard, veterinário e eu, na sala de A&B da Unip |
É uma experiência e tanto no Brasil. Como acho que vale super a pena conhecer o projeto, sugiro dar um google nas expressões criadouro de jacaré e Arurá e ver a seriedade da coisa. A ESALQ, conhecida escola de Piracicaba, e uma equipe multidisciplinar de veterinários e biólogos começaram os estudos com esses bichos. O resultado nos foi contado na apresentação do Dr. Glenn ontem. Eu separei alguns itens que considerei mais relevantes e agora conto pra vocês.
O jacaré-de-papo-amarelo é uma das 5 espécies que existem na fauna brasileira que são: jacaré negro ou jacaretinga (do pantanal); jacaré-aruará, jacaré- açu ou jacaré-gigante; jacaré-de-papo-amarelo, jacaré-do-focinho-largo ou ururau (que é o nosso deste texto aqui); jacaré-coroa ou paguá e jacaré-coroa ou caimão-de-cara-lisa.
No projeto Arurá , o jacaré-do-papo-amarelo se alimenta de cadáveres de frangos que seriam descartados como lixo por produtores granjeiros. Numa parceria as granjas fornecem os frangos mortos diariamente (que não são doentes, mas que não resistem ao ambiente estressado das granjas) e o criadouro dos jacarés usa como comida. A vantagem é que ele fica responsável por dar fim nesse resíduo que, em geral, é um problema para as granjas. Como os frangos são alimentados com rações muito proteicas, o alimento dos jacarés é de boa qualidade.
Por isso e pela própria característica do animal, a carne do jacaré é um alimento rico em proteína e com baixo colesterol.
A carne é macia, tenra e bem saborosa e embora tenha boa aceitação em diversos lugares, não é tão comum. Há quem tenha muito preconceito com esse tipo de alimento. No Brasil, onde o jacaré é visto como carne de caça predatória, e foi assim (acho que ainda é em alguns lugares) até bem pouco tempo, a população média ainda não costuma comprar em mercados com selo de origem e registro.
Um criadouro como o do projeto Arurá tem uma produção aproximada de 200 kg/mês, o que não é suficiente para exportação, já que o mercado internacional absorve bem o produto. Os valores variam de R$ 20 a 60 por quilo embalado e congelado e o canal de vendas diretas é o usado, sendo os compradores bares, restaurantes e butiques de carnes especiais.
O principal produto da criação dos crocodilos e também dos jacarés é o couro. Ele é que vale mais já que a indústria da moda busca muito esse tipo de insumo. Os preços são bem altos nesse mercado. Mas, segundo o Dr. Glenn Collard, as vendas de carne de jacaré da sua criação já ultrapassam os valores recebidos pelo couro.
Para a culinária, os cortes encontrados desse parente do crocodilo são: jacaré inteiro, costela, filé da cauda, coxa e sobrecoxa e isca (que é a parte mais proteica).
Nós pudemos degustar a carne do jacaré de papo amarelo durante a palestra. Só com alho, cebola, azeite e sal, estava muito saborosa. Com uma textura entre o peixe e frango, ela vem sendo usada com os mais diversos temperos e para fazer pratos muito comuns como moqueca, estrogonofe e sashimis. Mas há receitas bem mais sofisticadas dependendo de quem são os chefs que as preparam.
Há muito mais para saber sobre esse assunto. Eu gostei bastante do que vi, ouvi e degustei.
Dicas culinárias para fazer um bom jacaré:
– não vá caçar, compre uma carne garantida e de boa procedência
– tempere com antecedência de 4 horas as peças menores e as maiores na véspera
– cozinhe em fogo baixo e para as churrasqueiras grelhas altas.
Experimente!
Para saber mais:
Serviço:
Projeto Arurá – rodovia SP 107, km 39,5 – Artur Nogueira – SP
Agendamento de visitas pelo telefone: 19-3802-1154
Recortei umas informações técnicas sobre o nosso personagem para quem tiver interesse:
JACARÉ-DE-PAPO-AMARELO
Espécie de jacaré que já esteve na lista de animais ameaçados de extinção. Vive com freqüência nas florestas úmidas da Mata Atlântica e em terrenos de baixada pantanosas no Cerrado brasileiro.
Habitat: Brejos, mangues, lagoas, riachos e rios. Hábitos alimentares: Carnívoro. Reprodução: Desova entre 17 e 50 ovos por postura, que eclodem após 70 a 80 dias de incubação. Período de vida: Aproximadamente 50 anos.
Quando estão com a boca fechada os dentes do maxilar superior são visíveis. O quarto dente do maxilar inferior encaixa-se em uma depressão existente no maxilar superior, permanecendo invisível quando o jacaré está com a boca fechada.
Normalmente possuem ornamentos cônicos nucais deparados dos escudos dorsais. Toda a parte superior do animal é de coloração marrom escuro e parte inferior creme.
Pernas curtas; patas providas de grandes unhas. Aquático, permanecendo horas parado tomando banhos de sol. Ocorrem em rios e lagoas de água doce e salobra. São mais ativos durante a noite, alimentado-se principalmente de peixes. Ocorre sempre em grupos. Habita os domínios da Mata Atlântica.