Essa é mais uma daquelas invenções geniais que nos livram da culpa de jogar fora o que sobrou de comida e foi guardado na geladeira já faz uns dois ou três dias.
Especialmente o arroz é um acompanhamento que vai bem com tantos preparos, mas quase sempre a gente faz um pouco a mais do que é comido, então sobra e vai para o potinho da geladeira.
Um dia quando já não morava mais na casa da minha mãe cheguei para o café da manhã e fui logo procurando o que tinha pra comer. Abri o forno e vi um quarto de uma assadeira redonda grande com uma espécie de pizza, com presunto, queijo, tomate, cebola, azeitonas por cima. Lindo! Não era para aquela hora, eu sei, mas eu gosto de comer pizza no café da manhã, de preferência com café com leite. Tirei a cebola (eu que não como cebola assim porque meu corpo rejeita completamente) e mandei pra dentro. Minha mãe me deixou comer e perguntou do que tinha gosto. Respondi que era algo diferente, uma massa leve e fofinha, muito suave e que em nada parecia com massa feita com farinha de trigo. E não era mesmo feita de trigo, mas de arroz.
A beleza da pizza de arroz é a camaradagem que ela nos permite. Eu explico. Essa é uma comida que nos permite fazer uma verdadeira limpeza nas sobras da geladeira. É que ela também pode ser coberta com ingredientes que estejam dormindo há alguns dias no refrigerador, só aguardando para serem desperdiçados. Ai que culpa isso me gera! Odeio jogar comida boa no lixo, acho isso um absurdo, um despautério! Por exemplo, sabe aquele molhinho de carne com batatas que você pode ter feito na panela para o almoço e sobrou um pouquinho? E os dois palmitos que ficaram no vidro porque era um exagero por tudo na salada, a meia lata de milho verde que não foi usada no cuscuz, assim como as últimas fatias de presunto, aquele pouco de muçarela que está prestes a ficar desidratado, o pedacinho de queijo parmesão que não foi ralado nem comido, um pouco de aliche, o espinafre refogado, … ? Há ainda outros tantos, mas você vai saber combinar perfeitamente sem ficar um horror. Ou poderá fazer uma pizza de vários sabores.
Caso não tenha nada disso, compre queijo muçarela, tomates com óregano, sal e azeite de oliva, abra uma lata de molho para cobrir a massa e faça a tradicional pizza de queijo!
Na casa da minha sogra e entre os filhos do meu marido, se você decide pedir uma pizza no delivery e pergunta qual é preferência das pessoas é quase uníssona a resposta: – Pizza de queijo, claro! Aí não importa muito se é napolitana, muçarela ou marguerita, é pizza de queijo e pronto. Eles nunca mudam.
Logo na primeira vez que eu vivi essa situação, estávamos em família, eu ainda namorada, bateu aquela fome e pedir uma entrega de pizza foi uma decisão unânime. Então me perguntaram que sabor eu queria. Eu logo arrisquei uma de tomate seco com rúcula ou lombinho canadense. Causei espanto, pode acreditar! Isso porque a lógica usada na minha casa sempre foi bem diferente da deles. Para mim, pizza comprada na pizzaria ou que foi pedida no delivery sempre foi edição comemorativa de algum acontecimento, então, tinha que ser diferente, mais elaborada. Mas aprendi com eles que pizza pode ser de queijo mesmo que seja uma data comemorativa ou pizza pode ser de queijo porque não há nada para comemorar também. É quase um mantra:
– Que pizza a gente vai pedir?
– De queijo!
Voltando à pizza de arroz, ou melhor, à pizza cuja massa é feita de arroz, pode também ser de outros sabores além da preferência nacional.
Se quiser pode comer também só o massinha que já é um bom alimento, com carboidratos e proteínas. Nesse caso, em vez de óleo, use azeite de oliva que já terá um sabor sofisticado.
Receita de Pizza de Arroz
Ingredientes
2 xícaras de chá de arroz cozido
2 ovos
1/2 xícara de chá de óleo
1 xícara de chá de leite
1 colher de chá de fermento em pó
Modo de fazer:
Bata todos os ingredientes no liquidificador. Despeje numa assadeira rasa untada e enfarinhada. Deixe assar por cerca de 20 minutos em forno pré-aquecido em 200 graus. Retire do forno, coloque o recheio de sua preferência e volte ao forne para finalizar com o recheio.
Noite passada nossa pizza de arroz foi batizada de meia brasileira – meia italiana ou poderia ser metade couve, aliche e muçarela, metade napolitana (muçarela, parmesão e tomates).
Usei o resto do arroz integral e da mistura de sete grãos cozidos que estavam prontos na geladeira. Enquanto eu preparei a massa com ingredientes que eu já tinha, batia um papo no telefone com a minha mãe, contando todos os acontecimentos do fim de semana uma para outra. Nada mais acolhedor. Quando disse a ela que estava fazendo a pizza, tenho certeza de que ela ficou com vontade porque fica realmente muito gostosa.
Além de nos facilitar a vida e nos livrar da culpa de por fora alimentos de boa qualidade só porque são o restinho, essa é uma massa que pode ser feita para celíacos, aquelas pessoas que têm rejeição ao glúten. Como não leva farinha de trigo, é uma opção interessante e saborosa.
Sem desperdício
Enquanto estou escrevendo, mil e uma coisas me passam pela cabeça. Uma delas é que a sobra dos alimentos é um pouco de falta de planejamento da gente. Estive certa vez há muito tempo na casa de amigos e também de familiares na Itália onde nunca sobrava nada da mesa para ser guardado na geladeira. Todos tinham em casa uma balança para medir o tamanho da porção que seria preparada para cada pessoa. Um jeito muito prático de evitar o desperdício e também que a gente coma demais. Um prato equilibrado é mais que suficiente para que nos alimentemos bem. É gula comer mais que um prato. Só que a gente faz muito isso!
Lembrei-me agora da tia Dionízia que, sabiamente, dizia que sempre se levantava da mesa com um pouco de fome. Uns minutos depois se sentia plenamente saciada. Nunca via minha tia pedir um antiácido porque tinha comido demais. Ela era uma mulher bastante elegante, nunca foi gorda. Não só comia bem e gostava de comer (porque tem gente que não gosta, pode?!) como cozinhava divinamente. Nossa que maionese fazia a tia Dionizia. E a carne de panela? Delícias memoráveis.
A questão da saciedade, conforme já me explicou um nutricionista, diz respeito ao tempo que o cérebro leva para entender que já entrou no organismo alimento suficiente. Só que às vezes as pessoas comem muito rapidamente então comem mais do que precisam porque o tempo que demora para que o registro seja feito é de cerca de 20 minutos. Esse também é o motivo pelo qual deveríamos comer mais devagar e sentir mais o sabor das refeições.
Ainda sobre as sobras de alimentos preparados, eu posso falar por mim, sou exagerada mesmo. Tenho verdadeiro horror à possível falta de alimento suficiente à mesa. Talvez sejam resquícios da educação que tivemos lá em casa, algo que hoje, já bem adulta e faz tempo, eu deveria ter mudado, uma vez que já me questionei bastante a respeito. É que fomos criados num ambiente que podia não ter luxo algum, mas comida tinha sempre em excesso.
Além disso, a gente é mesmo egoísta e vem a cada dia perdendo os bons hábitos de tratar a vizinhança. Quantas vezes fazemos uma comidinha deliciosa e nem levamos o que sabemos que vai sobrar para o porteiro que vai trabalhar a noite toda? Por que não levamos um pedaço do bolo que fizemos para a vizinha da porta da frente?
Eu morei sozinha muito tempo e, graças a Deus, sempre tive ótimos vizinhos. Alguns mais próximos, mas gente que eu cultivei com palavras doces e alguns pedaços de bolo ou por quem fui cultivada recebendo potinhos de curau ou a chave da porta para entrar e usar o que precisasse enquanto meu apartamento estava em reforma. No prédio em que moro agora tenho vizinhos que, vira e mexe, nos trazem abacates. Ontem mesmo aconteceu isso. Em troca, já provaram meus brigadeiros, arroz doce… Eu sempre penso neles quando estou preparando algo que acho gostoso.
A vida é assim afinal, cheia de escolhas. Que possamos sempre fazer as melhores sobre o que e quanto comemos, como lidamos com os recursos que temos ou que buscamos, de que forma tratamos nossos vizinhos e também os desconhecidos. Como cuidamos da nossa família, o que ensinamos aos nosso filhos e tudo se resume em como vamos deixar o planeta, se melhor ou pior do que encontramos. É o nosso legado.
Hoje recomeçam minhas aulas. Estou ansiosa!
Clau, a sua comida é deliciosa não pelos ingredientes, nem pelo fazer, mas pelo amor que você dedica a ela. Te amo!
Silas, eu também te amo! Esse nosso encontro é que dá sentido às coisas. Beijos, meu amor.