Sem querer, em busca de uma caixa com copos ou utensílios herdados que deixei na casa da minha mãe, encontrei um tesouro. Uma caixa de madeira antiga que veio junto com uma máquina de costura da Vigorelli estava guardada num armário no quartinho do quintal. Eu já tinha visto essa caixa muitas vezes, mas por algum motivo, somente hoje resolvi dar uma espiada no que ela continha.
Que surpresa feliz!
Assim que abri encontrei vários papeis amarelados pelo tempo, dobrados, meio amassados, nos quais eu conseguia ver uma ou várias caligrafias, algumas mais rebuscadas e cuidadosas, outras nem tanto, feitas um pouco na correria, além de recortes de jornais e revistas já um tanto corroídos pelo tempo e pelo arquivamento sem o devido cuidado: uma caixa de receitas!
Caixa de receitas
Coincidência ou sincronia – Ainda ontem à noite, enquanto jantávamos na casa da minha mãe, ela, a Cris, a Giovana, o Silas e eu, comentávamos sobre a receita do Bolo Flor de Maio. Lembrávamos “de cabeça” o que ia no preparo do bolo, cada uma de nós (minha irmã Cris, minha mãe e eu, que tivemos contato direto com o bolo por anos) com uma versão diferente. Eu tenho uma receita e, para cada uma delas, a versão era um pouco diferente, com manteiga, com óleo, com os dois juntos, enfim, aquilo que já sabemos sobre a culinária de família. Sempre cheia de variações e vida própria.
Não é que o primeiro papelzinho que eu desdobrei esta manhã tinha a receita do bolo Flor de Maio? E o que é mais interessante, sem margarina, sem óleo, mas feito com manteiga e banha! E o fermento tem outra medida, são três colherinhas de fermento royal ou 1 colherinha de bicarbonato.
Eu não podia ficar mais entusiasmada com o que encontrei porque é um verdadeiro tesouro. Não importa o que contenham as receitas, elas são a história pura e verdadeira da minha família, uma família de muitas mulheres, mais do que homens, que, pelo que consigo julgar de imediato e guardo na memória, sempre gostaram de cozinhar.
Entre as delicadas folhas manuscritas, encontro letras feitas certamente pela tia Dionisia, pela tia Matilde, algumas assinadas, outras possivelmente feitas por algumas das crianças da época que ainda guardam como registro a tentativa de ostentar uma caligrafia que não fosse infantil. Isso é lindo! Eu fiquei e ainda estou muito emocionada.
Segundo minha mãe ao ver parte de um caderninho com vários preparos anotados de forma muito cuidadosa, mudando inclusive as cores da caneta, deve ter sido Matilde quem escreveu e enviou para minha avó Angelina no sítio. Minha avó não sabia escrever, mas conseguia ler algumas coisas e eu sei que ela gostava muito de receitas.
Algumas dessas receitas estão datadas o que me faz ter certeza que foram escritas na década de 30 do século passado. As “chícaras” ainda não se grafavam com x e açúcar era assucar, escrito com ss. Nessas folhinhas rabiscadas, algumas receitas exclusivas transmitidas entre irmãs outras copiadas de algum livro de receitas da época. Algumas páginas trazem 4 ou 5 preparos de bolos e há também as que, possivelmente, foram anotadas num programa de rádio e depois de televisão.
Desde que me conheço por gente, na minha casa sempre vimos programas de culinária e as mulheres corriam para anotar os ingredientes e o modo de fazer enquanto a Xênia, a Maria Tereza ou outra apresentadora que não me lembro acompanhavam cozinheiras como Ofélia e Etti Frazer dando espetáculo nos programas femininos. Fora isso, havia um encarte semanal do Estadão, o Suplemento Feminino, que era colecionado por causa, principalmente, das receitas que vinham com fotos ou ilustrações passo a passo sobre como fazer.
Outra incrível constatação do meu achado foram algumas páginas retiradas da revista Cruzeiro em 1950. As receitas eram publicadas na penúltima página e a última trazia Rachel de Queiroz respondendo cartas de leitores ou escrevendo sobre turismo.
Para meu deleite, essa página traz o expediente da revista. A presidente era Amélia Withaker Gondim de Oliveira e o diretor secretário ninguém menos que Austregésilo de Athayde, que em 1952, ganhou um prêmio da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, por sua destacada atividade jornalística
Diante dessa cápsula do tempo, em alguns meros segundos eu pude supor e imaginar histórias, relembrar rostos, vozes e cheiros da minha infância ou do que eu penso que ela pode ter sido, uma vez que a gente reconstroi memórias de muitas formas, consegui ainda visualizar redações de jornais no passado, imaginar gente nas casas recebendo a revista Cruzeiro ou escrevendo cartas para a colunista dona Rachel de Queiroz, que na época não tinha mais do que a minha idade atual.
Vendo uma página da revista Cruzeiro, definitivamente, vejo que é muita pretensão se achar original nos dias de hoje. Tudo já foi inventado. A gente podia era copiar de um jeito bem feito, mas, muitas vezes, nem isso faz. A revista era muito bem feita!
Só por curiosidade, tem uma folha arrancada da revista de 28 de junho de 1958. Na página da frente, vem o início de uma receita de bolo de leite de coco que continua na página seguinte, mas é intercalado por uma publicidade de aspirador de pó da Walita e o texto do anúncio é Leve como uma vassoura! Bom, não?
Muitas ideias estão agora passando pela minha cabeça sobre como tratar todo esse material tão rico, tão simpático e cheio de emoções contidas em receitas. Sem dúvida, ganhei o dia!
Bom dia da Independência. Hoje é 7 de setembro de 2014.
Boa noite!!!!! Poderia passar a receita flor de maio?? Pq pela foto não da para ver as medidas. Esse bolo é lembrança de infância do meu sogro. Um abraço
Gisele,
Desculpe a demora na resposta. Por algum motivo o seu comentário se perdeu no site, mas eu o resgatei.
Como não subiram todos os posts do Blog da Gavioli para o Minestrone, às vezes, preciso importar alguns. A receita está neste post do blog.
http://www.blogdagavioli.com.br/2014/06/uma-casa-com-luz-natural-e-amor.html
Espero que faça o seu sogro feliz.
Grande abraço! Clau Gavioli