Podem parecer exóticos e novos, mas a verdade é que os vinhos de Israel são produzidos desde os tempos bíblicos. A maioria é kosher, e isso está longe de ser um problema!
Era uma vez no Oriente
A oferta de vinhos israelenses no Brasil é mínima, apesar da boa presença de judeus e descendentes por aqui (2a maior colônia da América Latina e 11a do mundo). Essa escassez induz à impressão de que o vinho não é parte da cultura judaica, mas na verdade o consumo de vinhos é muito mais tradicional entre judeus que entre os europeus que o mundo do vinho convencionou chamar de “velho mundo”. Tanto aqueles que acreditam nas escrituras biblicas quantos os que preferem provas científicas já estão familiarizados com a ideia de que o vinho é parte importante na cultura humana há milênios. O local onde hoje situa-se Israel era parte do Crescente Fértil – a região em forma de bumerangue no Oriente Médio também conhecida como “Berço da Civilização”. O Crescente Fértil incluiu a antiga Mesopotâmia e foi o berço de uma série de inovações tecnológicas incluindo a escrita, a roda, a agricultura e o uso da irrigação.
Israel – onde o comércio de vinhos nasceu
Embora a prática da vinificação em si seja considerada como tendo começado em algum lugar no triângulo entre o Mar Cáspio, o Mar Negro e o Mar da Galiléia, foi nesta área que o negócio do vinho floresceu pela primeira vez e de onde a viticultura se espalhou, por meio dos fenícios, por toda a bacia do Mediterrâneo. O Mediterrâneo Oriental – incluindo a terra que se tornaria Israel – foi o berço do comércio mundial de vinho. A produção, que teve seu apogeu durante o império Otomano, foi interrompida no período de domínio muçulmano, brevemente retomada durante as Cruzadas, de 1100 a 1300 DC, e novamente paralizada em função da Diáspora. Ainda assim, durante todo o período, vinho foi produzido. Ainda que fosse apenas para as cerimônias religiosas.
De Bordeaux para Israel
O primeiro salto de qualidade na produção de vinhos de Israel veio de Bordeaux.
No século 19, colonos judeus replantaram vinhedos na Terra Santa para substituir aqueles que haviam desaparecido sob o domínio otomano. Foi então que o Barão Edmond de Rothschild, filho do dono do Château Lafite, criou a vinícola Carmel e começou a trazer o know-how da vinificação francesa para Israel.
Durante a maior parte do século XX a produção centrou-se em vinhos kosher, exportados para o mundo todo. Eram geralmente doces e feitos a partir de vinhedos de alto rendimento. Apenas no final dos anos 1960 a vinícola Carmel produziu o primeiro vinho de mesa seco. A produção de vinho sacramental atualmente é inferior a 10% do total.
Golan Heights – a grande revolução na qualidade dos vinhos de Israel
Fundada em 1983, a Golan Heights Winery é responsável pela revolução do vinho de qualidade em Israel. Críticos americanos se surpreenderam com a qualidade do Yarden Sauvignon Blanc 1983 que provaram. Apenas no ano anterior, a recepção havia sido mais cínica: ‘Não é vinho. É um líquido, mas não sabemos se é vinho ou não.’ – disseram os críticos. Aí veio a revolução. Os coletivos investiram US $ 100.000 e mais tarde foram apoiados por um subsídio do governo de US $ 1 milhão. Importaram um enólogo – Philip Steinschriber, treinado em Fresno nos EUA, compraram equipamentos de vinificação na Itália e produziram 3.000 caixas de um Sauvignon Blanc vintage de 1983 chamado Yarden. ‘Isso é bom. Nunca poderia ser de Israel ‘ – foi a receopção da crítica dessa vez.
Uvas israelenses, cultivadas em território sírio por kibutzniks israelenses, transformadas em vinho por um vinicultor da Califórnia com a ajuda de judeus iemenitas ortodoxos trabalhando com equipamentos italianos e barris franceses. The New York Times em: Campo de batalhas transformado em vinhedo israelense
A nova revolução do vinho de Israel
Muita coisa mudou após a revolução provocada pela Golan Heights. Atualmente, cerca de 300 vinícolas produzem mais de 40 milhões de garrafas de vinhos que agradam críticos ao redor do mundo, como Robert Parker e Hugh Johnson. Os enólogos vêm de todas as partes do mundo e as uvas cultivadas são majoritariamente as variedades francesas. A maior parte da produção é kosher mas, exceto pela obrigatoriedade de supervisão do processo por um rabino, os processos utilizados na produção de vinhos kosher em quase nada difere dos processos de produção dos melhores vinhos do mundo.
Vinhos kosher no Brasil
Os vinhos da Golan Heights, todos kosher, são importados para o Brasil pela Inovini e me impressionaram pela pureza de fruta que apresentam. Publiquei minhas impressões sobre ele no Instagram e transcrevo aqui. Em tempo: Golan Heights é um território anexado da Síria por Israel, mas há controvérsias quanto a quem pertence de fato. Segundo a BBC, a administração Trump foi a primeira a reconhecer a autoridade israelense sobre a área. A opinião internacional, em sua maioria, considera o território pertencente à Siria e ocupado por Israel. Já deu até problema de rotulagem essa questão. Para saber mais, vale conferir o podcast SV#114: Vinhos De Israel – Golan Heights Muitas “primeiras vezes” aqui: primeiro vinho #kosher , primeiro vinho de Israel e primeira vez depois de um bom tempo (tanto que nem me lembro) que me empolgo com um vinho tinto. O terroir é vulcânico (coisa linda do meu 🧡), mas não senti nada que me remetesse à controversa “mineralidade”. É uma fruta vibrante, ácida; madura e doce sim (até achei que o vinho talvez não fosse seco, mas é), mas com aquela suculencia de fruta fresca e picante colhida no quintal. Acho que o solo vulcânico atuou “afiando” o vinho. A 1a impressão é de fruta cristalina, precisa, unidimensional. Na boca vai abrindo com um leque de sensações. Complexo. Pra tomar um gole e ficar curtindo como ele se desenvolve. 14% de álcool que a gente toma sem perceber (e há muito tempo não tomava 1 garrafa toda no almoço!). Pelo preço médio de R$120 achei muito boa pedida. Maridaje foi com mignon e risoto de parmesão. O fato de nem ter foto é o melhor indicativo do tanto que estava bom! 😉 .